"Abaixo do Piso da Saúde, só há um porão incivilizado", alerta professora
2024-11-07
Autor: Lucas
No último dia do 5º Congresso de Política, Planejamento e Gestão em Saúde, que ocorreu em Fortaleza (CE) na terça-feira (6/11), a professora Élida Graziane, da FGV, fez um alerta contundente sobre a situação fiscal do Brasil e suas implicações para a saúde pública. A reunião do Congresso coincidiu com uma sessão do Comitê de Política Monetária (COPOM) do Banco Central, que decidiu por um novo aumento de 0,5% na taxa básica de juros. A professora denunciou que esse aumento nos juros, estimado em um impacto de R$40 bilhões, equivale ao que o governo pretende economizar com cortes nos gastos sociais.
Graziane enfatizou que o Brasil enfrenta uma "encruzilhada fiscal": será que o governo federal priorizará os interesses dos rentistas ou garantirá uma assistência pública de qualidade, como o Sistema Único de Saúde (SUS)? Durante o evento, a discussão também se estendeu à reforma tributária, e Graziane destacou que existem alternativas viáveis que não envolvem o corte de direitos ou a flexibilização do piso constitucional, que determina um investimento mínimo de 15% da Receita Corrente Líquida (RCL) para a saúde.
Ela enfatizou a necessidade urgente de se discutir os gastos mínimos em saúde pública e criticou o crescente volume de renúncias fiscais, que já chega a 7% do PIB, ressaltando o crescimento da saúde privada em relação ao SUS. Em um cenário onde as desigualdades sociais só aumentam, a professora questionou por que o governo está se contentando em cortar direitos em vez de explorar novas formas de arrecadação.
"Se não enfrentarmos a questão dos tributos não arrecadados e das renúncias fiscais, poderemos acabar como um país cuja despesa social é comparável à da África subsaariana", alertou. Esse reduto fiscal, segundo Graziane, é uma armadilha que prioriza o Teto de Gastos, uma herança do governo Temer, em detrimento de políticas públicas voltadas para os cidadãos mais vulneráveis.
Além disso, relatou que a distorção orçamentária está fazendo com que áreas essenciais, como a saúde, sofram com cortes. Por exemplo, enquanto emendas parlamentares eram pagas, as verbas para programas como o de imunização e Farmácia Popular estavam empatadas.
À medida que se discute planos para cortar ainda mais o orçamento de 2025, a professora alertou para a falta de propostas que visem a revisão das despesas com juros da dívida pública. Ao contrário disso, o Banco Central continua a aumentar a taxa de juros, intensificando o problema que afeta diretamente o financiamento da saúde.
"Nos últimos 30 anos, o aumento da dívida pública foi impulsionado principalmente pela elevação dos juros, e não pelos gastos sociais. Então, por que o foco continua sendo o SUS?", questionou Graziane.
Diante dessa quimera fiscal, a necessidade de investimentos em saúde pública só cresce, especialmente com o envelhecimento da população e novos desafios, como a crise climática e novas doenças. Desse modo, a professora descartou qualquer ideia de flexibilização do piso mínimo de gastos. "Abaixo do Piso, só há um porão incivilizado. É essencial que o orçamento se submeta aos direitos garantidos pela Constituição de 1988, não o contrário", concluiu.
Graziane alerta que a redução de gastos pode levar a um aumento da judicialização das políticas de saúde, pois a negação dos direitos pode obrigar o Estado a pagar precatórios. Ela ressaltou a importância de abordar o orçamento de saúde de uma forma sistêmica, evitando que cortes sejam feitos em áreas essenciais como Previdência Social e Educação, e clamou por medidas estruturais para aumentar a arrecadação e corrigir desigualdades fiscais que perduram há décadas.