As montadoras de automóveis tradicionais enfrentam uma batalha acirrada para se atualizar em um mercado cada vez mais dominado por inovações tecnológicas. De acordo com pesquisa da consultoria Gartner, apenas três fabricantes tradicionais - Ford, GM e BMW - estão entre as dez principais empresas em desenvolvimento de softwares automotivos. Em contraste, marcas chinesas como Nio, Xpeng e BYD, além de americanas como Tesla, Rivian e Lucid, dominam essa área crescente.

"Estamos em uma transição complexa que requer mudanças profundas tanto na mentalidade quanto na tecnologia", afirmou Anders Bells, diretor de engenharia da Volvo. Recentemente, a Volvo lançou seu SUV elétrico EX90, equipado com tecnologia de ponta da Nvidia. No entanto, a empresa encontrou desafios, como atrasos no desenvolvimento de um sistema computacional, que resultaram na ausência de recursos que muitos veículos elétricos já oferecem, como Apple CarPlay e carregamento inteligente de baterias. Estes recursos devem ser disponibilizados em futuras atualizações.

Historicamente, as montadoras contavam com suas equipes de engenheiros para desenvolver softwares internamente. Contudo, a crescente necessidade de inovação levou-as a buscar talentos em startups e gigantes da tecnologia como Apple e Google, o que gerou choques culturais e dificuldades internas. Um exemplo disso é a Volkswagen, que anunciou uma parceria de US$ 5 bilhões com a Rivian após enfrentar contratempos em sua unidade de software, Cariad. A Toyota também enfrenta dificuldades com sua subsidiária Woven, que registrou perdas de US$ 888 milhões recentemente.

Em relação aos seus planos, a Toyota afirma que está se preparando para lançar um novo software, Arene, em breve, atribuindo algumas de suas dificuldades a questões pontuais. Pedro Pacheco, da Gartner, adverte que os grandes fabricantes precisam revisar sua abordagem ao software para não ficarem atrás dos concorrentes mais ágeis.

Além de agregar novas funcionalidades, as montadoras estão interessadas no potencial financeiro da coleta de dados dos usuários e na oferta de serviços de assinatura, que prometem gerar receitas significativas. Embora atualmente os serviços digitais representem cerca de 3% das receitas globais do setor, previsões da Accenture indicam que esse número pode soar impressionantes US$ 3,5 trilhões até 2040, representando quase 40% das receitas totais da indústria automotiva. A Stellantis, por exemplo, espera obter US$ 22,4 bilhões anuais somente com softwares e serviços de assinatura.

Ao longo dos últimos anos, a Ford tem investido na contratação de executivos de empresas como Apple e Tesla, incluindo Doug Field, que liderou no passado o projeto de veículos da Apple. No entanto, o declínio contínuo das montadoras tradicionais no índice da Gartner levanta questões sobre a capacidade delas de capitalizar sobre esse crescimento esperado.

Em um panorama desafiador, a Goldman Sachs estima que o custo para desenvolver um sistema operacional para veículos seja de no mínimo US$ 11 bilhões. Apesar da dificuldade de monetização dos serviços, que envolve discussões sobre modelos de assinatura mensal, a previsão é que o potencial de redução de custos de reparos e aumento da lealdade dos clientes se torne um atrativo importante.

Bell, da Volvo, acredita que os desafios e os custos iniciais de desenvolvimento valerão a pena, pois as melhorias contínuas na segurança e desempenho dos veículos podem beneficiar os consumidores mesmo após a venda. À medida que a estrutura de computação comum for estabelecida, os custos de desenvolvimento de novos modelos tendem a diminuir. "Precisa-se realmente aprender a abraçar o software. Se não conseguirmos acompanhar o ritmo tecnológico, ficaremos para trás", conclui Bell.

Com a corrida dos softwares automotivos esquentando, fica a pergunta: quem conseguirá se reinventar a tempo para não ser engolido por esta nova era? acompanhar essa batalha tecnológica se tornará fundamental para todos os apaixonados por automóveis.