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Montadoras Tradicionais em Crise: A Batalha pelo Domínio dos Softwares Automotivos

2024-09-30

As montadoras tradicionais de automóveis estão enfrentando um momento crítico em um setor cada vez mais dominado pela tecnologia. Segundo a consultoria Gartner, apenas Ford, GM e BMW aparecem entre as dez principais fabricantes quando o assunto é desenvolvimento de software automotivo, enquanto as empresas chinesas como Nio, Xpeng e BYD, junto com as americanas Tesla, Rivian e Lucid, lideram a corrida.

"Estamos em uma transição complicada que requer uma mudança tanto na mentalidade quanto na tecnologia", afirma Anders Bells, diretor de engenharia e tecnologia da Volvo. A montadora sueca, agora sob a propriedade da chinesa Geely, recentemente lançou o SUV elétrico EX90, que vem equipado com sofisticados softwares e chips da Nvidia.

Entretanto, a Volvo não tem sido isenta de desafios, enfrentando atrasos significativos devido a falhas no desenvolvimento de seu sistema de computação, o que resultou na falta de recursos essenciais em seu novo modelo elétrico, como o Apple CarPlay e sistemas avançados de gerenciamento de bateria. Esses recursos devem ser disponibilizados em atualizações futuras.

Historicamente, as montadoras sempre confiaram em suas próprias equipes de engenheiros para criar softwares. No entanto, com a crescente complexidade dos veículos modernos, muitas delas estão buscando talentos em startups e gigantes da tecnologia, como Apple e Google, gerando tensões culturais e dificuldades de adaptação interna.

Um exemplo dessa nova abordagem é a Volkswagen, que estabeleceu uma parceria de US$ 5 bilhões (cerca de R$ 27,6 bilhões) com a Rivian, após enfrentar dificuldades com a Cariad, sua unidade de software. A Toyota também tem enfrentado desafios com sua unidade Woven, reportando perdas acumuladas de US$ 888 milhões (R$ 4,9 bilhões) nos últimos dois anos.

Apesar dessas dificuldades, a Toyota afirma estar no caminho certo para o lançamento de seu novo software, Arene, previsto para o próximo ano, embora algumas das perdas sejam atribuídas a fatores temporários.

O analista da Gartner, Pedro Pacheco, destaca que as montadoras precisam reavaliar suas abordagens em relação ao software. "Se não adaptarem sua mentalidade para isso, será incrivelmente difícil ultrapassar os concorrentes que estão na vanguarda", alerta.

Além de aprimorar as funções básicas dos veículos, a computação automotiva oferece um imenso potencial de receita, com estimativas sugerindo que os serviços digitais poderiam gerar até US$ 3,5 trilhões (R$ 19,3 trilhões) até 2040, representando cerca de 40% das receitas da indústria automotiva, de acordo com a Accenture.

A Stellantis, que integra marcas como Jeep, Peugeot e Fiat, projeta alcançar US$ 22,4 bilhões (R$ 124 bilhões) em receitas anuais provenientes de serviços de software e assinaturas. Ford, por sua vez, tem recrutado executivos de empresas como Apple e Tesla para reforçar sua estratégia tecnológica.

No entanto, a queda contínua das montadoras tradicionais no índice da Gartner levanta preocupações sobre sua capacidade de se beneficiar do crescimento projetado. O analista Kota Yuzawa, da Goldman Sachs, observa que o custo para desenvolver um sistema operacional automotivo pode ser superior a US$ 11 bilhões (R$ 60 bilhões).

A monetização desse potencial é um grande desafio, já que a utilização de veículos de propriedade privada é de apenas 5% do tempo, comparado ao uso constante de smartphones. Apesar disso, o desenvolvimento de software pode resultar em custos de reparos significativamente reduzidos, já que muitos consertos podem ser realizados digitalmente, além de aumentar a lealdade do cliente.

Anders Bells continua otimista. Ele acredita que, embora os custos e dificuldades iniciais sejam altos, vale a pena investir em tecnologia de software, pois a segurança e o desempenho dos veículos podem ser aprimorados mesmo após a venda. Além disso, os custos de desenvolvimento deverão diminuir à medida que uma arquitetura de computação comum se estabeleça. "É essencial aprender a abraçar o software; caso contrário, ficaremos para trás na velocidade que a tecnologia exige", conclui Bells.