Ciência

Famílias da primeira região árida do Brasil enfrentam a seca severa e o impacto das mudanças climáticas

2024-11-02

Autor: Pedro

Introdução

As secas prolongadas e as mudanças climáticas têm alterado drásticamente a paisagem da caatinga, onde as famílias, como a de Damázeio Francisco do Nascimento, 85 anos, vivem a triste realidade de um solo que já não oferece o mesmo sustento de antigamente. Damázeio, que nasceu um ano após o lançamento do clássico literário "Vidas Secas" de Graciliano Ramos, observa a desolação em termos de vegetação.

Mudanças na Caatinga

"A mata que era caatinga não tem mais. Os paus morreram todos, as braúnas morreram todas", lamenta.

Morando em Jurema, no município de Chorrochó (BA), Damázeio reconhece que o ambiente ao seu redor se transformou em um "tabuleiro", um solo árido cujo formato e cobertura vegetal são muito diferentes do que eram assim que as chuvas ocorriam frequentemente.

De acordo com um estudo recente do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) e do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), essa região é reconhecida como a primeira área com clima árido no Brasil. Significa que a evaporação da água é maior do que a precipitação, resultando em um grave déficit hídrico.

Impacto nas Cidades da Bahia

Essa realidade se estende para outras cidades do norte da Bahia, como Abaré, Macururué e partes de Rodelas, Curaçá e Juazeiro. Até mesmo a pequena região de Petrolina, no sul de Pernambuco, se enquadra nessa nova classificação climática. Os dados analisados foram coletados desde 1960, quando a realidade das secas começou a se intensificar.

Memórias da Infância

"Eu me lembro de quando eu tinha 5 anos. Nesse tempo chovia mais, tinha a caatinga e água para nós", afirma Damázeio.

Ele nota que mesmo quando chove, as colheitas são escassas. "Feijão e milho não dão mais. Um pouco de chuva e o solo esquenta, não dá para as plantas crescerem", explica.

Condições Agrícolas Deterioradas

Ana Paula Cunha, uma das autoras do estudo, corrobora essa afirmação, destacando que a transição de semiárido para árido prejudica a vegetação natural e torna o solo ineficaz para a agricultura.

Aumento da Temperatura

Aumento da temperatura média é um dos principais fatores que contribuem para a aridez, conforme observado por Cunha. Em regiões onde a chuva já era escassa, o calor excessivo provoca maior evaporação, e embora em alguns lugares a precipitação tenha aumentado, isso não compensa a perda de água do solo.

Consequências para a Biodiversidade

"A temperatura já está indo para 40ºC, uma realidade com a qual não estávamos acostumados", diz Israel da Cruz Oliveira, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Chorrochó, ao compartilhar suas preocupações sobre a perda de biodiversidade.

Espécies de plantas e até mesmo abelhas estão desaparecendo, e as condições de vida para as novas gerações na agricultura se deterioram. Sua preocupação é refletida no aumento do êxodo rural, principalmente entre os jovens.

Escolhas Difíceis para o Futuro

Professora Suelani Cipriano, 27 anos, é uma mãe que optou por permanecer. "A temperatura não permite que eles brinquem como eu brincava. Seria irresponsável deixá-los fora", afirma.

Adaptação e Resistência

A transformação do ambiente, apesar da nostalgia, não é sem esperança. Israel alerta que os que ficarem devem se adaptar, fazendo uso de irrigação mesmo quando há chuvas.

Desafios da Agricultura Atual

O contexto atual traz um desafio extra: os períodos de colheita têm se tornado mais curtos e a agricultura se restringe a estufas para proteger as plantações do clima severo. No entanto, menos da metade dos 1.600 trabalhadores rurais associados ao sindicato tem acesso a cisternas e assistência técnica que poderia mitigar esses efeitos.

Apoio e Necessidade de Políticas Públicas

A ONG Agendha, que atua na região, tenta fornecer suporte, mas enfrenta dificuldades em alcançar todas as famílias necessitadas. "Estamos em um território com mais de 7.000 famílias agrícolas e conseguimos atender apenas 1.080," lamenta a diretora Valda Aroucha, que enfatiza a necessidade urgente de políticas públicas direcionadas ao semiárido, especialmente agora que várias regiões enfrentam aridez extrema.

Conclusão

As mudanças climáticas exigem atenção e ação, pois, como Valda alerta, "não podemos pensar que isso é normal, o sofrimento das comunidades deve ser abordado". Ela acredita que a resistência e a persistência são fundamentais para enfrentar os desafios. Sua visão otimista se reflete em suas ações e no desejo de ver melhorias na qualidade de vida para as famílias que permanecem na região. "Não é mais como ‘Vidas Secas’, há um esforço crescente para criar soluções”, conclui, esperançosa por um futuro onde políticas públicas mais eficientes possam ajudar a revitalizar a vida no sertão.