Ciência

Estudo Revela Impactos Alarmantes da Cultura de Cancelamento no Instagram

2025-01-15

Autor: Gabriel

A chamada "linguagem do cancelamento" nas redes sociais, que envolve ofensas ao caráter ou à aparência dos alvos, a utilização de emojis hostis e a participação em campanhas de ódio, tem se tornado um reflexo preocupante de uma cultura de hostilidade. Esta é uma das principais conclusões de um estudo realizado por Mateus de Souza Miranda, da Faculdade de Letras (Fale), que analisa os efeitos devastadores desse fenômeno nas interações digitais.

No ano passado, Mateus apresentou sua dissertação no Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos (Pós-Lin), intitulada "A face digital na cultura do cancelamento: um caso de (im)polidez linguística?" O estudo se concentrou em quatro figuras públicas brasileiras que foram alvos do cancelamento: a influenciadora Gabriela Pugliesi, a antropóloga Lilia Schwarcz, o youtuber Monark e o ex-deputado Arthur do Val.

"Nosso objetivo foi investigar como a impolidez se manifesta na linguagem do cancelamento, analisando uma grande amostra de comentários extraídos de interações virtuais altamente divulgadas no Brasil", explica Mateus. A pesquisa utilizou tanto metodologias quantitativas quanto qualitativas para examinar as variadas estratégias verbais punitivas utilizadas pelos internautas. "Fomos capazes de quantificar palavras e frases que se destacam nos cancelamentos e interpretá-las à luz da teoria da impolidez linguística", acrescentou.

Os "canceladores", como descreve Mateus Miranda, empregam uma mistura de recursos linguísticos e ferramentas de comunicação digital para invadir o espaço virtual do alvo, com a "clara intenção de agredir". Isso demonstra uma dinâmica preocupante, onde a impunidade online fortalece a cultura do ódio e da desumanização.

Episódios Analizados

Durante a pandemia de covid-19, a influenciadora Gabriela Pugliesi se tornou alvo de ataques ao compartilhar vídeos de uma festa em sua casa, ignorando as diretrizes da OMS. Os internautas a rotularam de "irresponsável" e "egoísta", levando-a a desativar suas contas. Outro caso marcante foi o da antropóloga Lilia Schwarcz, que sofreu hostilidade após criticar o álbum da Beyoncé, sendo acusada de racismo.

O youtuber Monark enfrentou o cancelamento em 2022 após defender a criação de um partido nazista no Brasil, sendo atacado com insultos. Arthur do Val, por sua vez, viu sua carreira ruir depois de comentários desrespeitosos sobre mulheres ucranianas, o que lhe custou apoio político e seguidores.

Esses casos revelam um padrão: o uso pessoal do pronome 'você' por parte dos canceladores, que humaniza suas agressões. Mateus também observou o uso intenso de emojis, como os de náusea e vômito, para expressar repulsa. Palavras de conotação negativa, como "merda", também são comuns nas postagens de cancelamento.

Metodologia

A pesquisa envolveu a coleta de aproximadamente 1.500 comentários postados no Instagram, utilizando ferramentas do site Sketch Engine para analisar grandes volumes de dados textuais. Esta análise se apoiou na abordagem forma-função e na pragmática de corpus, proporcionando uma visão detalhada sobre as estratégias de impolidez empregadas nas interações online.

De acordo com Mateus, a dinâmica do cancelamento não apenas reflete mas também reforça a sensação de pertencimento e poder entre usuários que se agrupam em torno de um objetivo comum. "Esses canceladores se colocam em uma posição de superioridade moral, se sentindo à vontade para agir de forma impiedosa. O objetivo é levar o cancelado a desaparecer das redes ou sofrer consequências reais, como perda de patrocínios e cargos", explica.

Em um cenário de crescente conscientização sobre a necessidade de regulamentação do uso da internet no Brasil, Mateus destaca que sua pesquisa pode contribuir para o desenvolvimento de materiais educativos sobre comportamento digital e (im)polidez. Com a exposição constante dos alunos à linguagem agressiva online, promove-se a necessidade de discussões sobre o uso ético das tecnologias, desafiando tanto educadores quanto estudantes a repensarem seus comportamentos no ambiente digital e na vida real.

A verdade que ninguém fala sobre a cultura de cancelamento

— esse estudo não apenas expõe uma faceta sombria da interação online, mas também nos convida a refletir sobre nossas responsabilidades enquanto usuários da internet, a fim de cultivar um espaço digital mais respeitoso e saudável.